(Texto
publicado no Jornal de Muriaé de 15.12.2006)
Infelizmente,
as tristes manchetes divulgadas diariamente pela imprensa (assassinatos,
tráfico de drogas, corrupção, etc.), já não conseguem me agredir como outrora.
“Neste mundo a gente se acostuma com tudo”, já dizia meu pai. Inclusive com as
coisas ruins; infelizmente, repito.
Mas
O Globo de hoje (07.12.06) trouxe reportagens que me tocaram de forma especial,
porque demonstram claramente que o Brasil está passando por um “apagão
gerencial”, conforme título da coluna de Merval Pereira.
A
coisa é muito mais grave do que mostra a ponta do iceberg do “apagão aéreo”.
Trata-se de administrar um país falido com uma dívida de R$ 1 trilhão, que
consome anualmente cerca de R$ 150 bilhões de nossas divisas, e que cresce
menos de 3% ao ano.
Entretanto,
não é difícil entender, pois se o partido que coordenou a reeleição do
presidente não sabe elaborar uma simples prestação de contas (p. 4), como
poderá assessorar e colaborar na administração de um país da complexidade do
Brasil? Como sou mais um “Eremildo Idiota”, acredito que a prestação de contas
é honesta e que a falha se deve à pura incompetência.
Um
“apagão aéreo” que envolve menos de uma centena de controladores de voo se
transforma num caos, inclusive colocando em risco a vida de pessoas inocentes,
como o caso do garotinho que se acha na fila para um transplante de fígado.
Para
ninguém levar este texto muito a sério, aliás, conforme ocorre com tudo no
Brasil, também me chamou a atenção o fato de que “Lula e dona Marisa planejam
adotar criança” (p.12). Lembrou-me a situação muito comum entre casais que
buscam tal alternativa para resolverem problemas de um casamento em crise.
Vamos
ao mestre Freud. Será que o presidente não está identificando e transferindo a
crise do país para o seu casamento? Falando sério, Bussunda, em 1985, uma
equipe de especialistas liderada pelo professor Hélio Jaguaribe profetizou:
“Se,
entretanto, a inércia popular, a incompetência das lideranças e os estreitos egoísmos
corporativos que parasitam o Estado e a sociedade não permitirem que se
empreenda, apropriadamente, esse esforço de reforma social e de reforma do
Estado, não pode haver dúvidas quanto ao fato de que mergulharemos, dentro dos
próximos anos, numa situação de irremediável caos.
Não
será mais possível andar nas ruas, porque os bandidos se terão apropriado do
controle das cidades [...] nesse ambiente de caos e de inviabilidade da
existência coletiva, os mais capacitados abandonarão o país, em inauditas ondas
migratórias. Está na coluna do Ancelmo Góis: Germano Gerdau [ex-marido da
senhora Ana Cristina, assassinada no Rio] “pensa em se mudar para os Estados
Unidos por causa da violência no Brasil”.
Outra
reportagem que me chamou a atenção (p. 37): “Ao avesso da boa gestão privada”.
Assim começa o texto: “A estratégia adotada pelo governo para lidar com a crise
no setor aéreo vai contra o receituário de especialistas em gestão
empresarial”. Lá também se encontram as observações dos especialistas: “o
primeiro passo é adotar qual a abordagem será usada”, “outra medida
indispensável é escolher uma pessoa responsável pela gestão”, “é preciso traçar
frentes de longo e curto prazos” e “é preciso assumir a crise e apresentar
dados mais objetivos”.
Mas,
afinal, qual a razão de todo esse lero-lero?
O
problema é que a sobrevivência da quase totalidade dos municípios brasileiros
depende de transferências dos governos estadual e federal. E, sinceramente, não
consigo me sentir seguro a longo prazo quanto aos recursos transferidos por um
governo que não está conseguindo administrar uma crise localizada.
E
o que é pior, acreditar num governo que não dispunha de um plano estratégico
alternativo para enfrentar uma situação que, mesmo localizada, pode comprometer
seriamente a imagem do país.
Chegamos
finalmente ao que interessa às presentes e futuras gerações, ou seja, será que
os Planos Diretores dos municípios estão contemplando as abordagens
estratégicas que devem ser adotadas a curto e longo prazo? Será que não estamos
correndo riscos de “apagões de falta d’água”, “apagões de desemprego” e, sem
trocadilho, “apagões de segurança”? Minha preocupação sempre aumenta quando me
lembro da historinha do sapo cozido em banho-maria. Infelizmente é o que vem
acontecendo, e principalmente a classe média não acorda. Ia-me esquecendo:
FELIZ NATAL!
JOSÉ
ANACLETO DE FARIA é Mestre em Planejamento Regional e Gestão de Cidades.